quinta-feira, 13 de maio de 2010

[Resenha] Paradigmas1, parte I

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Uma resenha que estou devendo há algum tempo:

Bem, o livro é uma coletânea de 13 contos de fantasia e ficção científica, variando desde o cyberpunk à ficção histórica, com lendas rurais, urbanas e até uma passagem pelo new weird. A idéia  era trazer contos que quebrassem com os paradigmas comuns, trazendo idéias novas e situações antes impensadas. O objetivo é fazer o leitor encontrar histórias diferentes, e posso dizer que a maioria dos contos cumpriu com seu dever.

E gostaria de parabenizar os editores pelo formato do livro. A idéia de quebrar os paradigmas na própria diagramação foi muito interessante, e nos surpreende quando não encontramos o índice, ou vemos o que seriam três introduções. A idéia ficou bastante agradável. E, claro, o preço é bastante acessível.

Abaixo, as resenhas dos primeiros 6 contos. As demais estão por vir.

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MAI-NI Expressas - Richard Diegues
Como o próprio autor colocou, um cyberpunk à latina. Segundo ele, seu conto buscou quebrar os paradigmas ao fazer a trama secundária aos personagens, e de fato, pouco ou nada se sabe sobre o que acontece ou vai acontecer. O foco da narrativa é Cid, um entregador do mais alto nível de entregadores da MAI-NI Expressas. Há ainda Glenda, outra entregadora, mas com certeza a personagem mais presente depois de Cid é sua moto, a Shadow Runner, que pode sair do repouso até 1600 km/h em menos de um minuto.

O conto tem leves toques de humor e muita velocidade. Achei-o bem escrito, e é interessante a abordagem da internet: quando o usuário se pluga a realidade ao seu redor é remodelada , ele nunca deixa o espaço físico, mas vê, ouve e interage dentro de um espaço virtual.

O único ponto estranho do conto é quando os entregadores se reunem. Durante a leitura, somos induzidos a crer que o nível de entregador NI-6, o mais alto, difícil e trabalhoso de ser obter. Mas então, num bar escondido da estrada, vemos vários NI-6 e NI-5 bebendo juntos. A passagem pelo universo do conto é curta, seria interessante haver níveis menores de entregadores - até em maior quantidade - para justificar a raridade dos níveis altos.

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Vento, seu fôlego. Mundo, seu coração - Jacques Barcia
Na minha opinião, o melhor conto do livro. O texto é bem escrito e tem o êxito de fugir de nossa fantasia euro-ocidental. Jacques nos brinda com uma realidade alternativa baseada na mitologia, filosofia e religião hindu, um hindupunk, eu diria. A magia é lançada por monges balísticos, as cidades possuem usinas de chi com canais de feng-shui, e um deus vingativo traz destruição. O universo foi muito bem construído, é uma pena que tenhamos que deixá-lo logo, já que é um conto é curto.

É muito interessante o que Jacques veio mostrar: que há outras culturas e outras matérias com as quais podemos fazer literatura, não só o costumeiro capa-e-espada e fantasia medieval ocidental. Há uma gama de países e culturas que podem e devem ser utilizadas. Não desmereço os demais temas, mas  acredito que a literatura deva andar por todo o campo do estádio, e não se restringir à grande área. Que haja jogadores na zaga, mas que não faltem no meio-campo e ou no ataque.

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Um forte desejo - M. D. Amado
Um conto que funde medo, sexo e mistério. O paradigma a ser quebrado pelo autor foi escrever na voz de uma mulher, mas confesso que achei certas passagens e falas muito masculinas. Um dos três contos da coletânea que foram ambientados em nosso próprio mundo, em nossa própria época.

Sedução e terror: a idéia óbvia era um vampiro, tão em voga na literatura de hoje. Amado contornou o óbvio e criou seu próprio Terror, cumprindo com a proposta do livro. E o mistério é bem trabalhado, mesmo no final do conto.

O ponto fraco foi o último parágrafo. A narradora-personagem o escreve no presente, mas duvido que alguém possa escrever na situação dela naquele momento. Nesse ponto, o conto pecou por falta de verossimilhança.

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O Mendigo e o Dragão - Bruno Cobbi
O new weird do livro, pelo menos pelo que entendo do gênero. O conto junta tráfico de drogas,  corrupção, magia, combate armado e survival horror. O conto dono do parágrafo mais interessante e bem sacado do livro: a descrição, em português coloquial mesmo, das criaturas enfrentadas.

Como o próprio autor ressalta, foi um belo desafio quebrar paradigmas utilizando justamente o ícone mais conhecido e utilizado das histórias da fantasia, o Dragão. Utilizou inclusive o tema do tesouro do dragão, conhecido de muitos rpgistas. A abordagem, no entanto, não peco por falta de origi nalidade!

O ponto ruim que encontrei foi um tanto no desenrolar dos fatos, ou a maneira como o autor os dispôs. O conto é dividido em 6 partes: Prólogo, Parte1, Parte2, Interlúdio, Parte 3 e Epílogo.Os narradores mudam em cada parte, mostrando pontos de vista de diferentes personagens, em cenas distintas. É preciso um pouco de esforço para juntar as peças, principalmente com as informações tomadas por gírias e coloquialismos dos personagens.

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Una - Roberta Nunes
Uma sacralização do prazer, por aí já uma quebra de tabus. Una é uma alienígena metamorfa cuja função é ensinar aos povos de todos os sistemas o prazer pelo prazer. Os nomes foram um tanto alterados, mas vemos uma reescrita de uma história muito conhecida de todos, dessa vez na visão daquela que foi rejeitada.

A autora utiliza um recurso de que gosto muito, o de comentar sobre coisas inexistentes como se fossem já conhecidas do leitor, não explicando, deixando os detalhes à cargo da imaginação do leitor.

Só torci o nariz para a 'forma original' do Renegado. Entendi que a idéia era justamente a referência à nossa cultura, mas conto se sairia muito bem sem essa 'forma original', não tão original assim.

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Fogo de Artifício - Eric Novello
Uma fantasia urbana noir pautada num dos clássicos da literatura infantil, Alice, do Lewis Carroll. Fundiu-se a história infantil com violência e cenas eróticas.

O protagonista é Ícaro, mago investigador do BEAST, Batalhão de Especial de Assuntos Sobrenaturais. O personagem é convincente, não um herói ingênuo; é bem humano em suas especulações e pensamentos. Os antagonistas: uma quadrilha que se inspira - se é que não o são - nos  personagens de Alice, sendo a própria Alice a assassina chefe. Atacam lojas de brinquedo e  tomam  a vidas de crianças. O que Alice quer é o corpo de Ícaro. E ele vai pagar pra ver...

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