domingo, 27 de setembro de 2009

[Conto] A Pena da Fênix

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(1180, em um pequeno oásis no deserto)

Khalid correu para chamar Nadim. Estava animado, algo assustado, e puxava o amigo com pressa para lhe mostrar algo. Chegando perto de uma colina, começou a andar devagar e encorajou o outro a fazer o mesmo. Ao se aproximarem do topo, deitou no chão e puxou Nadim para baixo:

_ Veja, veja! – apontou – E fique quieto, senão ele irá embora. Veja ali, ali, em cima da palmeira, aquele pássaro...

Nadim então viu o pássaro dourado e vermelho e por pouco não soltou uma exclamação. O tamanho, a beleza das penas, as cores de fogo... Não havia dúvidas, aquele era o pássaro-do-sol, aquele que renascia das próprias cinzas! O pai de Khalid havia lhe contado histórias fantásticas sobre a fênix ainda na noite passada, depois de ouvirem as façanhas do grande Saladino, e agora ela estava justamente ali, no oásis, tão perto e tão real... Khalid tentou levantar devagar para poder vê-la melhor, mas apesar de ser pequeno, o pássaro o viu. Ao invés de se assustar, a ave encarou os dois meninos com um olhar altivo, analisando-os, medindo-os, e assim ficaram por algum tempo. Então, ela abriu suas grandes asas e alçou vôo para o céu azul, veloz como nenhuma outra ave, e rapidamente ganhou o horizonte. Os meninos ficaram atônitos, felizes por tê-la visto e tristes por já ter partido.

Enquanto Nadim ainda olhava para cima, Khalid reparou em algo vermelho, estranho, caindo devagar das folhas da palmeira. Correu até lá, secundado pelo amigo, e encontrou o maior dos tesouros de toda sua vida: uma pluma cor de fogo. Uma pena de fênix!

As histórias sobre a fênix diziam que quando sua morte se aproximava, ela construía uma pira funerária com ramos e incensos, se incendiava, e de suas cinzas renascia. O pai de Khalid também contou que, embora poucos soubessem, aquele que guardar uma pena de fênix consigo no momento de sua morte arderia em fogo no amanhecer do dia seguinte, e, assim como o sol, renasceria. Renascer! Esta palavra ecoava na mente de Khalid com um trovão poderoso. Estava fascinado!

_ Khalid, o quê que você vai fazer com isso aí? – perguntou Nadim, com ingenuidade.
 
_ Como assim Nadim? – perguntou ele – Vamos guardá-la! Vamos mostrar pra papai, ele vai ficar muito, muito contente!

_ Mas ele não vai acreditar na gente, Khalid...

_ Claro que vai! Foi ele quem contou a história!

Mas quando voltaram para casa, Hassan, o pai de Khalid, riu e disse que a pena era uma pena comum: havia um pássaro vermelho que visitava aquele oásis freqüentemente. Ele mesmo já o vira algumas vezes. Contou que penas de fênix são raríssimas e muitos iniciariam uma guerra para obtê-las. As crianças ficaram desanimadas, e Hassan, para compensar isso, disse para a guardarem, quem sabe não seria realmente uma pena de fênix? Eles ficaram contentíssimos. Hassan riu e abraçou as crianças.

O povo do pequeno oásis logo soube da história e os dois meninos ficaram conhecidos pela sua “pena mágica”. Quando cresceram, Nadim logo perdeu o interesse, mas Khalid ainda acreditava nela. A pena passou a ser o tesouro mais caro do garoto.
 
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Ambrósio acordou com os primeiros raios da manhã em seu rosto, na casa de seu sítio, no Rio de Janeiro. Todas as vezes que fizera isso, sempre, sonhava o mesmo sonho. Levantou-se, nu, de cima da mesa onde estava deitado. Limpou-se, cobriu-se com um manto ao alcance da mão, e foi se mirar no espelho. Seu rosto era jovem, belo, mas seus olhos continham o peso de muitas vidas. Sentou-se numa cadeira.

Preciso de um novo nome, pensou. Pôs-se então a relembrar o sonho e o amigo de infância. Sentia-se um pouco só. Nadim, sinto tanto sua falta, amigo. Tudo, tudo faz tanto tempo... Já sei, vou me chamar Júlio! Júlio... É, é um bom nome, e está na moda entre os jovens. Voltou para a mesa onde estivera e retirou das cinzas ainda mornas uma pena vermelha.
 
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Cometário do autor: Esse foi meu segundo conto, bastante incentivado pela autora e amiga Rita Maria Félix. Um tentativa de escrever algo pequeno. Espero que o resultado tenha ficado agradável.

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